DEMOCRACIA DA INFORMÁTICA - MACKENZIE - PÓS-GRADUAÇÃO ( LATO SENSU ) – 2000
Autor: Carlos Alberto de Andrade Franco Bueno

V – CONCEITOS DA VOTAÇÃO POPULAR

Nós analisamos alguns métodos de participação popular com algum tipo de votação e discussão pública, mas não encontramos nenhum tão abrangente e tão funcional como o Orçamento Participativo.
“O Orçamento Participativo (OP) não é apenas um exercício de divisão das receitas e das despesas municipais pela própria população. Por causa de sua amplitude — a metrópole conta com 1,3 milhões de habitantes, no coração de uma região metropolitana de 3,3 milhões — e pelo seu método, rigoroso e evolutivo, ele constitui uma experiência de democracia direta sem equivalente no mundo.” (Cassen – 1998 – 17)

Ele próprio parece ser a continuação de trabalhos promissores de participação popular, instaladas em âmbito municipal.
“Obviamente que as experiências mais revolucionárias e geradoras de uma nova cultura política ficaram limitas, pela correlação de forças estabelecida, ao âmbito do poder local (Gondim, 1991) , como é o caso do "Fórum do Prezeis" (fórum criado na primeira gestão de Jarbas Vasconcelos em Recife - 86/88 - e que permitia a participação popular na gestão de projetos de urbanização em "zonas especiais de interesse social"), do "Funaps Comunitário" (fundo redefinido na gestão Luiza Erundina em São Paulo - 89/92 - e aberto para experiências autogestionárias de construção de moradia popular) e do OP (participação popular na definição de prioridades e critérios para o orçamento municipal nas cidades administradas por frentes populares em que o Partido dos Trabalhadores participa).” (Baierle, 1998, 18)


As grandes cidades que tiveram sucesso com o Orçamento Participativo são: Santo André, Belo Horizonte e em especial Porto Alegre. No caso de Santo André, embora eles foram também pioneiros (inicio em 1993), houve uma interrupção de 4 anos. O caso de Belo Horizonte, também exemplar, começou em 1993.

Como qualquer novo movimento, ele é polêmico entre os acadêmicos, mas já o movimento de aceitação deste Orçamento Participativo e outros de tipo similar entre os analistas modernos.
"A despeito da matança acadêmica selada pelo postmorten de muitos analistas, os movimentos populares brasileiros estão vivos e constituem elemento importante na conformação de processos democráticos no Brasil. Os movimentos populares, especialmente quando se levam em conta as enormes restrições cognitivas, estão impulsionando o Brasil para um modelo político de democracia participativa" (Ottmann, 1995, p. 188).


Orçamento Participativo e suas características

1. Ingredientes ideais para a formação de um orçamento participativo
1.1. Vontade política do governo
Como a constituição Brasileira de 1988 ainda não fornece suporte político pronto e efetivo na formação de um governo com Administração Popular, apesar dos avanços contidos na mesma, é primordial essa vontade política, enquanto esse suporte político ainda não é realizado.
“Recentemente, outros autores mostraram que certo tipo de instituições de Estado, em geral criadas de cima para baixo, podem induzir o ativismo cívico em comunidades com pouca experiência prévia de cooperação. Em numero recente de World Development, Peter Evans (1996) reuniu uma série de estudos que relatam formas de "empowerment" induzido pelo Estado. Ostrom (1996) e Watson (1995) descrevem a política de construção participativa de esgotos em Recife, onde a participação foi diretamente estimulada por atores estatais. Lam (1996) argumenta que o sucesso de uma política de irrigação decentralizada em Taiwan brotou das relações próximas e flexíveis entre atores estatais e agricultores envolvidos. Fox (1991,1996) mostra que mesmo em um contexto autoritário, setores reformistas da burocracia mexicana puderam promover políticas que fortaleceram e transferiram poder para organizações camponesas. Em livro recente, Tendler (1996) mostra como o governo do Ceará evoluiu de "mau para bom" com a implementação de políticas de assistência direta à organização da sociedade civil nos municípios. Em todos esses casos, tanto as relações próximas entre atores estatais e cidadãos, quanto o fato de que as políticas públicas explicitamente encorajaram a organização cívica, levaram não só ao fortalecimento de grupos cívicos mas também ao aumento de sua capacidade política de pressionar pela transparência no governo e por políticas públicas efetivas. Este círculo virtuoso de comunicação e confiança, a que Evans chama de "sinergia Estado-sociedade", sugere que a relação entre sociedade civil e instituições democráticas fortes está longe de ser um processo simples, unidirecional , de baixo para cima.
Para entender como atores estatais podem promover o associativismo, convém examinar a literatura sobre movimentos sociais, que desde há muito vem tentando explicar porque as pessoas se mobilizam. Diversos autores notaram que explicações econômicas não são satisfatórias: a propensão a se associar não está relacionada a certos níveis de miséria ou bem-estar. Fatores políticos parecem explicar melhor porque a organização cívica eclode em certos momentos e lugares e não em outros. Mudanças e descontinuidades no cenário político geram "janelas de oportunidade" das quais "ambientes propícios" podem emergir que convençam as pessoas de que a ação coletiva será frutífera (Tilly, 1978:98-142; Tarrow, 1994). "Os movimentos sociais se constituem quando cidadãos comuns, algumas vezes encorajados por líderes, respondem às mudanças nas oportunidades que reduzem os custos da ação coletiva, revelam aliados potenciais e mostram onde as elites e as autoridades são vulneráveis" (Tarrow, 1994:18).” (Abers – 1998 – 16)

“A Vontade Política dos Governantes em Estabelecer um Novo Relacionamento com a Sociedade e a Construção Coletiva de Regras para o Funcionamento do Orçamento Participativo.
O Orçamento Participativo induziu mudanças na estrutura administrativa do Estado (Município) para possibilitar a participação da sociedade civil. Assim foram criados o Gabinete de Planejamento (GAPLAN), responsável pelo planejamento orçamentário e a Coordenação de Relação com a Comunidade (CRC), que estabelece a rede de contatos com as comunidades.
Os representantes do Orçamento participativo, no salão nobre da Prefeitura, passaram a ocupar um espaço que antes era fechado, discutindo e definindo a alocação dos recursos do Orçamento Municipal, considerado uma "caixa preta" porque sobre estes assuntos só opinavam e decidiam os técnicos e os governantes. Subverte-se assim a lógica anterior, que separa o Estado da sociedade civil, a partir de um processo de co-gestão da coisa pública.
O Orçamento Participativo exigiu que o aprendizado fosse mútuo, todos deveriam construir as regras que operam a hierarquização das demandas e da distribuição dos recursos orçamentários. Todos que participam do Orçamento Participativo atuam como sujeito na configuração do modelo de participação e de elaboração do Orçamento Municipal. No início, não havia uma metodologia pronta, mas uma imensa vontade de fazer. ” (Abers – 1998 – 16)

“Em primeiro lugar o da coexistência de dois poderes: de um lado a câmara de vereadores e, de outro, os fóruns de setores e o conselho do OP. Num país onde o salário mínimo mensal é de R$ 130,00 (cerca de 700 francos), explica Pont, ‘os conselheiros do OP, voluntários, nos dizem seguidamente : somos nós quem trabalhamos. Então, para que servem os vereadores que recebem R$ 4 500,00 por mês para não fazerem nada ?’
Como conciliar a democracia participativa com a democracia representativa, sobretudo se quisermos estendê-la de uma cidade a um Estado, ou até mesmo a todo um país?” (Cassen – 1998 – 17)

“Na década que antecedeu a administração petista, poucas regiões da cidade haviam desenvolvido movimentos de bairro organizados e participativos que contestassem as políticas estatais. Várias outras associações de bairro dispersas pela cidade eram na verdade geridas por cabos eleitorais de políticos clientelistas. Somente a abertura de canais participativos não foi o suficiente para mudar esse quadro. Apenas quando a política ganhou credibilidade é que a estrutura do associativismo começou a mudar, transformando velhas formas "contestatórias" de ativismo em ativismo positivo e propositivo (uma tarefa difícil por sí); tornando abertas e participativas as associações antes fechadas e clientelistas; trazendo um amplo espectro de novos ativistas e associações de bairro à cena.” (Abers – 1998 – 16)


1.2.Justiça tributária.
Os que mais ganham tem que pagar uma taxa de condomínio maior (Ver item 2.3. Problemas a serem resolvidos ou diminuídos – Problema P7);

1.3.Conflitos e discussões nas reuniões.
Esses conflitos produzem tanto retrocessos como avanços. O importante é que o OP construa uma arena para o seu processamento político.
“No Orçamento Participativo de Porto Alegre os conflitos não são evitados, mas transformados numa fonte permanente de negociação, onde constantemente as regras que são públicas e transparentes, vão sendo reformuladas e aperfeiçoadas. “ (Pozzobon – 1998 – 15)


1.4.Mudança da gerência da prefeitura.
Esta passa a não tratar mais exclusivamente de executar obras e serviços que acha prioritárias, mas de junto com o povo, desenvolver a capacidade gerencial, ter um projeto político econômico alternativo aos “salve-se quem puder” dos defensores do mercado como solução para tudo.

1.5.Associações comunitárias
Centradas em regiões como, por exemplo, associações “amigos de bairro”. Essas associações tem sua expansão assim que começa a dar frutos a auto gerência. Quanto mais associações comunitárias existir numa região, mais rapidamente essa região é integrada nesse Orçamento Participativo.
“Sujeitos Organizados com Vontade Política de Construir o Orçamento Participativo.
O final dos anos 70, mas com maior força nos 80, foram caracterizados como um período de retorno ao associativismo, em especial dos Movimentos Populares Urbanos. Embora o centro das lutas no país, ainda fosse a derrubada do Regime Militar, vários movimentos surgiram e "passaram a desenvolver ações reivindicatórias e/ou contestatórias, tendo por eixo a posse da terra e o acesso aos serviços urbanos. Estas ações traduziam, principalmente, a afirmação de uma cultura de direitos" (Telles, 1984, apud Baierle,1998). Para Baierle "a mobilização destes setores que se organizaram primeiro a partir do que se considera direito básico da cidadania, constituíram em elemento importante na conformação de processos democráticos no Brasil" (Baierle,1998).
Embora Porto Alegre apresentasse uma longa e sólida história de luta, "que vinha desde os anos 50 com a criação de Associações de Moradores, processo este que teve por base os governos trabalhistas, sobretudo na gestão de Leonel Brizola" (Baierle,1998), também aqui acontece a reativação da participação popular. ” (Abers – 1998 – 16)


1.6.Auxiliar a solidariedade
Auxiliar a construção de uma solidariedade negociada entre setores sociais diversos de forma a diminuir as desigualdades das demandas sociais necessárias para o desenvolvimento de uma população
“Em última instância, as decisões tomadas pelas assembléias sobre como distribuir os investimentos refletem tanto as motivações egoístas dos mais organizados quanto a preocupação ética em assegurar que os mais pobres não sejam abandonados.” (Abers – 1998 – 16)


1.7. Disseminação da Informação
Sem disseminar a Informação aos participantes e à população é impossível o desenvolvimento do Orçamento Participativo. Os integrantes necessitam de Informações atualizadas e idôneas sobre todos os assuntos relevantes às tarefas prioritárias e suas definições.
“Num contexto em que o setor governo praticamente detém a primazia das informações, pode até o conselheiro sentir desconforto em votar determinada proposta, mas fica difícil recusar o voto se ele não tiver condições de construir uma argumentação consistente que respalde sua posição. Como os conselheiros só se encontram nos espaços dos próprio COP, havendo pouca articulação de bastidores (ao contrário das regiões), nem seminários, eventos de formação ou de debates paralelos, suas posições tendem a ser tanto mais fragilizadas quanto mais longe o tema em disputa estiver de suas plenárias regionais ou temáticas.” (Baierle, 1998, 18)

Na nossa Constituição de 1988 há um artigo que abrange e torna possível a solicitação de praticamente qualquer informação do Governo.

“TÍTULO II

Dos Direitos e Garantias Fundamentais

CAPÍTULO I

DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS

...
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;” (Consituição 1988 – Brasil – 14)

A abrangência de um orçamento participativo pode ir de apenas mais um conselho municipal até ser o embrião de uma nova forma de democracia.


2. Resumo de como funciona em Porto Alegre
2.3. Problemas a serem resolvidos ou diminuídos
3. Metodologia de Funcionamento e Tabela de Prioridades – Belo Horizonte

Volta para Capitulo IV – LEGISLAÇÃO ATUAL SOBRE VOTAÇÃO POPULAR
Avança ao Capitulo VI – O FUTURO: ‘DEMOCRACIA DA INFORMÁTICA’


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